segunda-feira, 30 de abril de 2007

Insuficiências

Pisar as lágrimas, esta noite, e queichar-me do frio da chuva a alagar-me os pés. Estes calafrios desconfortáveis a lembrar que sofri hoje e ontem e que sofri sempre assim a segurar as lágrimas, a manter a maquilhagem no lugar, porque tudo tem o seu lugar menos eu. O frio dói ainda mais nestas queimaduras - o teu gelo queima, sabias? - e teimo em não me aquecer, hei-de estar tão gelada que não me restará mais espaço para qualquer outra dor. Não podes crescer! - berro cada vez mais alto na minha revoltada mudez e aperto-me e contorço-me e mordo-me para me livrar do caos. Onde foi que me arranhei desta maneira que faz doer tanto ou tão pouco - doer pouco é uma forma de sofrer mais - que só me apetece cuspir, cuspir-te de mim, cuspir-me para longe? Quando foi que te alimentei que até me esqueci de todas as promessas que tinha feito - noite após noite quando não fechava os olhos nem por um segundo - para me livrar da outra sombra e agora... Tu aqui, porquê? Tudo o que se engrandece no meu coração - orgão de insanidade fatal - me esmaga. Hás-de ficar pequenino e insignificante porque assim insuficiente és perigoso demais.

sábado, 21 de abril de 2007

Há dias assim...

Há dias assim...
Em que os pulsos se cortam a eles mesmos,
Em que a tua paz implora por guerrear e prepara um a um os teus soldadinhos de chumbo.
Há dias assim...
Em que o meu sentimento secreto se dilui em banalidades e morre por si mesmo,
Em que te vejo um vidro estilhaçado que fugiu com o meu sorriso.
[e são frias estas lágrimas...]
Há dias assim...
Em que me acabo nas ruas para me manter inteira,
Em que és todo chuva e eu tremo por um raio de Sol.
[aquece-me por favor...]
Há dias assim...
Em que deliro com palavras que estão por vir desde sempre
Em que me ofereces um silêncio bonitinho porque não sabes.
[tu nunca sabes...]
Há dias assim...
Em que não aguento que seja assim.

domingo, 15 de abril de 2007

Gato preto pingado de branco

[Como um]
Gato preto pingado de branco,
Esse sofrimento disfarçado
- sempre -
De pensamentos plastificados.
Admoestrado pela vida - suada de medos -
Uma doente
Coisa infeliz...
Os olhos turvos de sangue,
Esventraram-lhe o respirar.
A potrefação dos sonhos - como fede!
Cuspiram-lhe as asas fora,
É gato - não precisa.
O céu dos pássaros fica mais distante que eu do mundo.
Liberdade disparada à queima-roupa.
Saudade meticulosamente pregada ao peito
[O meu].

sexta-feira, 6 de abril de 2007

Vírus

Confiei-te um segredo: o meu respirar. Disse-o meu, disse-me recuperada e dona de mim. Mentira mais bonita não podia haver, não fosse ter-me esquecido de me convencer disso.
Rasgo-me todos os dias em dores por pensar varias vezes que penso demais. E penso-nos assim no meio do caos em que teimas esconder-te - sentimento todo tu indefinido.
Purgatório doloroso este. Sentia mais um pouco e era feliz, sentia um pouco menos e tinha paz. Sinto assim e enlouqueço no pulsar constante desse rosto pouco revelado e do outro mal apagado - duas portas entre-abertas.
E os cheiros... O teu, o dele, o meu? Todos eles contaminados. Sou toda vírus.
Náuseas.
Dor.
Caos.
Cheiros.
Portas.
Fechem-se.
Por favor.

domingo, 1 de abril de 2007

Finalmente... O Grito

És assim um sonho bem desenhado
Que flui por essas paredes que te fazem artista
Com a suavidade da imaginação
Daquela que te vê - assim real.
E ainda ouço aquela flauta dentro de mim,
Melodia que liberta o meu corpo viajante,
Como a ondulação desses cabelos compridos
Que invadem - indiscretos - as longas noites
Em que luto impaciente contra os delírios
Das palavras que teimam em ser soltas.
Podia soletrá-las sílaba a sílaba
Mas ainda é cedo, ainda há medo
Desse carinho que desce das tuas mãos
E me desperta para a vertigem desses olhos que usas em mim
E que - quase fechados - engolem os meus.
[Porque esqueço tudo.]
E há valsas entre a tua língua e o meu umbigo
Que quase se perdem um no outro
No descompasso dos corações [e até a neve fica vermelha]
Não fosse batermos com a cabeça no horizonte
E percebermos que o dia passou e nem abrimos os olhos.
A delicadeza com que apagas a tua luz em mim
Tatua antecipadamente a minha pele.
Mas a noite é fria e o álcool também
E pressinto aqui o bater das asas [nem sei porque não as tens]
Ferindo a existência do nosso vínculo discreto
Ausente e desinteressado do meu sofrimento...
Aquela merda de dor que nunca esquece a minha cara.